Como a música ajuda a preparar o cérebro para a interação

A musicoterapia tem sido estudada como uma forma de apoiar crianças autistas em áreas importantes do desenvolvimento, como a comunicação e as relações sociais. Um estudo realizado em 2018 mostrou resultados significativos ao utilizar sessões individuais de musicoterapia improvisacional com crianças entre 6 e 12 anos de idade, comparando-as com um grupo que recebeu uma intervenção não musical, mas equivalente em tempo e estrutura.
Durante as sessões, que aconteciam semanalmente com duração de 45 minutos, as crianças participavam ativamente de experiências musicais, como cantar, tocar instrumentos e improvisar sons em interação com a terapeuta. Essa prática tinha como foco promover a comunicação verbal e não verbal, estimular a atenção conjunta e favorecer o engajamento social.
Os resultados mostraram que a musicoterapia trouxe uma melhora significativa na comunicação social pragmática, medida pela Children’s Communication Checklist (CCC-2). Isso significa que as crianças passaram a usar a linguagem de forma mais funcional em situações sociais, incluindo aspectos como fala, semântica, inícios de conversas, relações sociais e interesses.
Outro achado relevante foi a mudança na conectividade funcional cerebral, observada por meio de exames de neuroimagem (rs-fMRI). Após a intervenção musical, houve aumento da conectividade entre o córtex auditivo e áreas subcorticais e motoras, regiões que costumam estar menos conectadas em pessoas autistas. Essa mudança esteve associada à melhora na comunicação social, sugerindo que a música atuou diretamente nos circuitos auditivo-motores do cérebro.
Além disso, o estudo identificou uma redução da hiperconectividade entre áreas auditivas e visuais, que costuma estar presente no autismo e pode estar ligada à sobrecarga sensorial. Essa diminuição esteve relacionada a melhorias comunicativas, indicando que a musicoterapia ajudou a reorganizar essas conexões cerebrais de forma mais equilibrada.
Os benefícios não se limitaram apenas às crianças. Houve também uma melhora na qualidade de vida familiar, medida pela escala Family Quality of Life. As famílias relataram aumento em aspectos como coesão, interação e estratégias de enfrentamento do dia a dia, mostrando que a intervenção teve um impacto positivo na dinâmica familiar.
Esse estudo foi pioneiro ao demonstrar, com evidências de neuroimagem, que a musicoterapia pode não só apoiar a comunicação social de crianças autistas, mas também promover mudanças reais na neuroplasticidade cerebral e fortalecer as relações familiares. Ainda que mais pesquisas sejam necessárias, esses achados apontam para a relevância da música como recurso terapêutico científico e transformador.
Fonte: DOI 10.1038/s41398-018-0287-3